terça-feira, 30 de novembro de 2010

Ponto de vista

belo é o verde do mundo
o verde dos sorrisos
o verde da comida
o verde da hipocrisia

a beleza da falta de comida
a pobreza da falta de sorrisos
a grandeza da hipocrisia
a falta que faz a falta de cor

o muro de Berlim
a bomba de Hiroshima
(e por que não a de Nagasaki?)
os mísseis Tomahauk

a tristeza da sua vida
a leveza da sua inutilidade
a superficialidade do seu intelecto
a consideração das suas palavras

o egocentrismo da sua humildade
o egoísmo da sua voluntariedade
a decadência da sua piada
a arrogência da sua moda
(tudo isso é bonito)

você no centro do mundo; no centro do tudo
no fundo da sua ignorância; no fundo do poço

no fim da linha; no fim da sua vida

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Out of season (Beth Gibbons & Rustin Man) - 2002

(Beth Gibbons)

Eu não tenho palavras para descrever o quanto sou completamente apaixonada por esta mulher... por sua voz... e tudo o que ela faz... (Pronto! Falei!).
E, pra quem gosta de boa música, ouçam o CD Out of season (2002)... (pra baixar, clique aqui).

sábado, 27 de novembro de 2010

Do avesso

E ela estava em transe
(E por que, quando assim, fechamos os olhos?)
E a música cantou
E Renato advinhou
Com aquelas palavras
Exatamente o avesso
E ela percebeu que havia esquecido
Até o porquê de estar escrevendo
(E) Agora (?)
E ela pensou em lembranças,
Que deviam ser lembradas de olhos fechados,
Com os olhos abertos

E ela se arrependeu
No escuro
Do que pensou (e)
Do que escreveu

Por quê?
De novo:
Não se sabem respostas
E não há desculpas.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Noir

Dois

Ela estava meio tonta
E não era da bebida
Era da música
Que a fazia olhar turvo
Que a fazia andar em nuvens de vidro
Ela quis explicar
Por que poesia era
Conto que era
Crônica que era
Romance que
Não era mais relato
E ela escreveu em versos
Percebeu como frase
Olhou como capítulo
E esqueceu como fumaça
Há perguntas?
Não se sabem as respostas
Ou desculpas?
Desejou:
Exploda-se o mundo
Imundo
Porque ela se amava
E se ama
Mais e mais.


_________________________

E o universo pintou:
Por que na mesa do bar
Qualquer bar
Sozinha e acompanhada
De longe pelos que a gostavam
Deperto (talvez) pelos que nem tanto
Tudo se revelava
(Tão fosco)
No nítido filme
(Analógico,
Queimado pela luz)
(De prata)
Numa foto presente
De um passado já
Inexistente
De um futuro tão palpável.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

...

Este era o primeiro capítulo

É preciso, novamente, conhecer os lugares que, um dia, nos abrigaram
Reconhecer os cantos escuros ou mal iluminados
Refúgios quando estávamos com medo.
Pois o medo voltou. A solidão instalou-se novamente.
Crianças felizes, sorrisos infantis não são mais paliativos para a dor
Nem lembranças, nem amigos, nada existe mais.
A sensação de torpor que o álcool provocava, agora, demora a chegar.
O dia está claro, as pessoas são vivas
E morre dentro dela a esperança.
Nenhuma droga alivia isso, esse peso
Apenas aquelas do sono eterno.
Parece romântico
Mas atitudes românticas têm um propósito:
O descanso. O descanso merecido
Merecido ou procurado ou desejado ou fugitivo.
A busca por lugares agradáveis revela o desagradável. O indesejável
Sentada ao lado de um arbusto, tentando se esconder de tudo o que se movimenta.
Tudo isso passou por sua cabeça
Tudo isso foi pensado, foi sentido.
Mas a dor não se aplacava.
O vazio.
E aquele medo
Termendo. Inquieta. Sozinha.
As sensações apenas vinham. Desconexas
Mas tudo parecia se encaixar.
Uma ode a si mesma. Um elogio a si mesma. Um fim.
Algo se aproximava
Ela não sabia o que era
Mas sentia. Sentia algo.
Mais do que a fumaça rasgando sua garganta
Mais do que sentir.
Uma ode a si mesma.
Mais. Sempre Mais.
E esse mais a levou para lugares obscuros
Claros, mas obscuros
Cegos, mas obscuros.
Fazia tempo.
E fazia tempo que isso não acontecia a ela
Fazia tempo, também, que ela não fazia isso.
Ela sabia, agora, a grande questão do mundo, o seu grande segredo.
Sabia ela, no final, que eram muitas perguntas
E nenhuma resposta.
Lembou-se de seus ídolos
Lembrou-se de Clarice. E de Lygia.
E de Ana Luisa.
Queria ser austera como ela. Como ela aparentava.
Queria ser ela.
Queria ser ela?
Era ainda ela?
Não sabia.
Àquela época, alguém havia morrido
Ela o escutava
E alguém imaginário também havia partido
E não havia ninguém mais para matar.
O torpor estava chegando
Mas ele, logo, seria aplacado
Ela não queria
Nem que, no outro dia, ela tivesse que rodar o mundo.
Ela já não se reconhecia
Nem em si, nem nos outros. Como tanto, e insistentemente, e fracassadamente, tentara.
As horas, os minutos passavam.
Ela não queria
Queria que algo terminasse
Até aquilo. Até aquilo?
Aquelas expectativas a incomodavam
Mas ela sabia que o final só poderia ser escrito ao cair do dia.
Coisas se acumulando. Acumuladas
Nada mais representava um desafio, um estímulo
Apenas as lembranças retornavam aos seus olhos
Talvez fora a inspiração que tivesse acabado.
A sensação de torpor talvez pudesse ajudar.
Mas ela sabia que o final só poderia ser escrito ao cair do dia.


 ______________________________________________

Angústia maldita que não passava!

_______________________________________________

Histórias, talvez, na verdade, sejam feitas apenas para serem contadas e compartilhadas. Jamais vividas. Ou, se vividas, depois, terminadas, para serem contadas e compartilhadas.

_______________________________________________

E assim terminava o primeiro capítulo da história de Ana Luisa.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

... onde começo ...

Atrás do reflexo

É noite então
E sinto como se amanhecendo
Mas não acorda um dia
Abre-se um olhar
Vejo-me no espelho
Ele não reflete o fundo
(O que está atrás de mim)
Ele, o espelho,
Imprime a outra face
Aquela que permite eu me ver
Aquela que permite
Não vislumbrar o que está além
Mas ele, o espelho,
É o portal para o futuro
Que se esconde
No fundo de areia amarela pintada de mostarda
E quando o sol surgir
Parecerá noite
E estarei nos seus braços
Sonhando acordada
Com o que se esconde (e se revela)
Atrás do espelho.